segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Gravação de conversa por um dos interlocutores. Licitude da prova.

Gravação de conversa por um dos interlocutores. Licitude da prova.



Tribunal Regional do Trabalho - TRT3ªR.

Processo: 01566-2007-104-03-00-0 RO

Data de Publicação: 06/08/2008

Órgão Julgador: Segunda Turma

Juiz Relator: Juiza Convocada Taisa Maria M. de Lima

Juiz Revisor: Juiza Convocada Maristela Iris S.Malheiros

Ver Certidão

RECORRENTE: nome retirado a pedido

RECORRIDO: CARGILL AGRÍCOLA S.A.

EMENTA: GRAVAÇÃO DE CONVERSA POR UM DOS INTERLOCUTORES - LICITUDE DA PROVA. A gravação de conversa, quando realizada por um dos interlocutores, é admissível no processo do trabalho como meio de prova válido, na forma do entendimento dominante na jurisprudência.

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Recurso Ordinário interposto contra a r. sentença proferida pelo MM. Juiz da 04ª Vara do Trabalho de Uberlândia, em que figuram, como recorrente, xxxxxxxx e, como recorrida, CARGILL AGRÍCOLA S.A..

RELATÓRIO

O MM. Juiz da 04ª Vara do Trabalho de Uberlândia, Dr. Marcelo Segato Morais, pela r. sentença de fls. 931/935, cujo relatório adoto e a este incorporo, julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial.

Recurso ordinário do reclamante, às fls. 937/987, argüindo cerceamento do direito de defesa e pretendendo a revisão do julgado quanto a indenização por danos morais.

Contra-razões às fls. 992/1034, pelo não conhecimento do documento de fl. 988 e pelo desprovimento do recurso.

É o relatório, em resumo.

VOTO

JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

Próprio, tempestivo e preenchidos os demais pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

JUNTADA DO DOCUMENTO DE FL. 988

Argüi a recorrida preliminar de não conhecimento do documento de fl. 988, anexado pelo reclamante ao recurso ora analisado.

Com razão.

Incumbe ao autor, quando da interposição da ação e apresentação de sua peça inicial, alegar toda a matéria de fato e de direito objeto de sua pretensão, sendo este, inclusive, o momento processual correto para a juntada de documentos e de delimitação da litiscontestatio.

Se o documento colacionado pela parte for juntado quando já preclusa a prova documental, só deverá ser aceito se fizer prova de fatos ocorridos depois dos articulados, nos termos do artigo 397 do CPC.

No entanto, embora apresentado em documento novo (datado de 13.05.2008), a prova trata de fato pretérito, posto referir-se ao atendimento clínico ocorrido em 12.05.2005.

Dessa forma, não cabe a apreciação do documento, porquanto ocorreu a preclusão lógica e temporal, que retira da parte a oportunidade de revolver fases processuais superadas.

E por tratar de fato velho, não cabe a apreciação do documento, à luz do artigo 397 do CPC, que dispõe ser "lícito às partes, em qualquer tempo, juntar aos autos documentos novos, quando destinados a fazer prova de fatos ocorridos depois dos articulados, ou para contrapô-los aos que foram produzidos nos autos."

Dessa forma, desconsidero a juntada do documento de fl. 988, porque não se trata de documento novo, e tampouco existe prova inconteste nos autos da impossibilidade de sua juntada em momento oportuno, estando fora, portanto, da hipótese legalmente permitida (Súmula 08, do TST).

JUÍZO DE MÉRITO

CERCEAMENTO DE DEFESA - PROVA ILÍCITA

Entende o reclamante ter sido cerceado em seu direto de defesa, em razão do indeferimento, pelo MM. Juízo a quo, do requerimento de realização de prova pericial.

A prova técnica teria por objeto a degravação dos CD's, que contêm gravação de conversa entre o autor e seus superiores hierárquicos, comprobatória - segundo afirma o recorrente - do assédio moral sofrido.

A realização da perícia foi indeferida sob o fundamento de tratar-se de prova obtida por meio ilícito, considerando que o próprio reclamante confessa que, das gravações, não tiveram ciência os demais interlocutores (fl. 879).

O artigo 5º da CR/88, em seus incisos X e XII, garante a inviolabilidade da intimidade e da vida privada das pessoas, bem como o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.

Dessa forma, como regra geral, é vedada a violação do sigilo das comunicações sem a autorização dos interlocutores.

Contudo, há que se distinguir a gravação obtida por interceptação da conversação alheia - essa considerada ato ilegal e abusivo, e, portanto, meio ilícito de prova - do registro de conversa própria.

Assim, data maxima venia do decidido, a gravação de conversa, quando realizada por um dos interlocutores, é admissível no processo do trabalho como meio de prova válido, porque não afronta a inviolabilidade e a vida privada, revelando lícito exercício do direito de defesa.

Cumpre registrar que, conquanto na prova oral tenham sido mencionadas, pelas testemunhas, as recorrentes "brincadeiras" dos colegas do autor - não caracterizadas pela r. sentença como configuradoras do dano moral - o alegado assédio praticado pelos superiores hierárquicos do reclamante quando de seu retorno ao trabalho após o acidente sofrido somente poderia ser provado pelas gravações juntadas aos autos.

Razoável e lógica a conclusão de que o registro das referidas conversas não poderia ser feito com autorização prévia dos demais interlocutores. Por conseqüência, o reclamante estaria impedido de comprovar suas alegações, em flagrante cerceio ao direito de produzir provas.

A licitude da gravação de conversa feita por um dos interlocutores tem sido reiteradamente confirmada no âmbito deste Tribunal, do Colendo TST e do Excelso STF, conforme decisões a seguir transcritas:

"EMENTA: COMUNICAÇÃO TELEFÔNICA -INTERCEPTAÇÃO - VIOLAÇÃO DO SIGILO - MEIO DE PROVA INADMISSÍVEL NO PROCESSO DO TRABALHO - EXCEÇÃO - Nos termos dos artigos 818 da CLT e 333, I, do CPC, compete ao Autor a demonstração da ocorrência dos fatos controvertidos, que dão origem ao direito reivindicado. (...) No contexto da ressalva contida na parte final do inciso XII, assim como no art. 1º., da Lei n. 9.296/96, combinados com o art. 332, do CPC, não se afigura possível a interceptação telefônica para outros fins " inclusive trabalhistas "que não os previstos expressamente: investigação criminal e instrução processual penal. Assim, seja na origem, seja por derivação de investigação criminal, eventual interceptação não pode perpassar aquela seara, posto que, embora a árvore não esteja contaminada, os seus frutos estariam. Todavia, em alguns casos, diferentemente da interceptação, a gravação clandestina, que é a gravação de conversação diretamente por um dos interlocutores, partícipe da conversa, deve ser admitida. Se não houver a participação ou a interceptação de terceiro, ainda que com o conhecimento de apenas um dos interlocutores, a ilicitude se despotencializa, porque é o próprio interlocutor gravando diretamente conversa da qual é agente. Apesar de bastante restritiva, essa exceção deve ser admitida, pois várias empresas já adotam esse método, apesar da comunicação ao interlocutor que a conversa está sendo gravada". (Quarta Turma, 00035-2008-077-03-00-3 RO, Relator: Desembargador Luiz Otávio Linhares Renault, publicado em 08.07.2008).

"EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA - DEFERIMENTO DE PROVA - TRANSCRIÇÃO DE GRAVAÇÃO DE CONVERSA FEITA POR UM DOS INTERLOCUTORES - LICITUDE - Conforme estabelece o art. 131 do CPC, cabe ao juiz, verificando a pertinência, a adequação e a legitimidade da prova, decidir sobre a necessidade de sua produção para a formação de sua convicção pessoal acerca da lide. Assim, não fere direito líquido e certo dos réus o ato judicial que determina a transcrição, por um perito, de fita magnética contendo gravação telefônica feita por um dos interlocutores da conversa, figurante no pólo passivo da relação processual. Na espécie, não se verifica a violação a princípio legal sobre prova, conforme jurisprudência firmada pelo STF". (1a Seção Espec. de Dissidios Individuais, 01068-2006-000-03-00-3 MS, Relatora: Juíza Convocada Adriana Goulart de Sena, publicado em 24/11/2006).

EMENTA. GRAVAÇÃO TELEFÔNICA. A aceitação no processo Judiciário do Trabalho, de gravação de diálogo telefônico mantido pelas partes e oferecida por uma delas, como prova para elucidação de fatos controvertidos em juízo, não afronta suposto direito líquido e certo da outra parte, a inviolabilidade do sigilo das comunicações telefônicas, porque essa garantia se da em relação a terceiros e não aos interlocutores. Recurso Ordinário a que se nega provimento, para ser confirmado o acórdão regional, que negou a segurança requerida. (TST-SDI-I ROMS n 11134/90, Relator: MINISTRO ERMES PEDRO PEDRASSANI, decidido em 17.09.1991, publicado no DJ de 27.09.1991, PG 13394).

"EMENTA: CONSTITUCIONAL. PENAL. GRAVAÇÃO DE CONVERSA FEITA POR UM DOS INTERLOCUTORES: LICITUDE. PREQUESTIONAMENTO. Súmula 282-STF. PROVA: REEXAME EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO: IMPOSSIBILIDADE. Súmula 279-STF. I. - A gravação de conversa entre dois interlocutores, feita por um deles, sem conhecimento do outro, com a finalidade de documentá-la, futuramente, em caso de negativa, nada tem de ilícita, principalmente quando constitui exercício de defesa. II. - Existência, nos autos, de provas outras não obtidas mediante gravação de conversa ou quebra de sigilo bancário. III. - A questão relativa às provas ilícitas por derivação ¾ "the fruits of the poisonous tree" ¾ não foi objeto de debate e decisão, assim não prequestionada. Incidência da Súmula 282-STF. IV. - A apreciação do RE, no caso, não prescindiria do reexame do conjunto fático-probatório, o que não é possível em recurso extraordinário. Súmula 279-STF. V. - Agravo não provido." (AI-AgR 503617/PR. Relator: Min. Carlos Velloso, Julgamento: 01/02/2005, Segunda Turma, publicação: DJ 04-03-2005)

Reconhecida a licitude da prova pretendida pelo autor, há que ser autorizada a perícia para degravação dos CD's juntados aos autos, sob pena de configurar-se cerceamento ao direito de defesa do autor. Ficam afastadas, desde já, quaisquer alegações de violação aos incisos X, XII e LVI do artigo 5º da CR, pois, como dito, ratificada a licitude da prova.

Pelo exposto, declara-se a nulidade da r. sentença de fls. 931/935, determinando-se o retorno dos autos à Vara de Origem, para reabertura da instrução processual, a fim de que seja autorizada a realização de perícia para degravação dos CD's juntados aos autos, que deverá ser considerada como meio de prova válido, proferindo-se, então, novo julgamento, como se entender de direito.

Prejudicada a análise das demais questões aventadas no apelo.

CONCLUSÃO

Conheço do recurso e, no mérito, dou-lhe provimento para declarar a nulidade da sentença de fls. 931/935, determinando o retorno dos autos à Vara de Origem, para reabertura da instrução processual, a fim de que seja autorizada a realização de perícia para degravação dos CD's juntados aos autos, que deverá ser considerada como meio de prova válido, proferindo-se, então, novo julgamento, como se entender de direito.

MOTIVOS PELOS QUAIS,

O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em Sessão da sua Segunda Turma, hoje realizada, analisou o presente processo e, unanimemente, conheceu do recurso; sem divergência, deu-lhe provimento para declarar a nulidade da sentença de fls. 931/935, determinando o retorno dos autos à Vara de Origem, para reabertura da instrução processual, a fim de que seja autorizada a realização de perícia para degravação dos CDs juntados aos autos, que deverá ser considerada como meio de prova válido, proferindo-se, então, novo julgamento, como se entender de direito.

Belo Horizonte, 29 de julho de 2008.

TAISA MARIA MACENA DE LIMA

RELATORA

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